Primeiramente, Chapecó, Joaçaba, Lages, Itajaí, Rio de Janeiro e Argentina, Depois, o resto do mundo
O veículo utilitário estacionado na rua Benjamin Constant, centro de Lages, em frente à Catedral Diocesana, na manhã desta terça-feira (4 de abril) retraiu a pressa dos motoristas e atraiu o olhar de quem passava de carro ou a pé pelas vias e calçadas. Não era qualquer caminhoneta, trata-se de uma caminhoneta com Camper, um módulo equipado com espaço de convivência, acomodado sobre a caçamba da pick-up, com a possibilidade de ser destacável para o uso livre do veículo.
E além do mais, esta que estava em Lages era toda estampada, com o desenho de uma colmeia de abelhas. É para chamar a atenção mesmo! Para alertar a população a respeito da prevenção e manutenção do controle de uma das doenças mais sérias do planeta Terra, a diabetes.
O veículo constitui uma expedição inusitada, idealizada pelo psicólogo e médico brasileiro, Javier Cordeiro, criado entre os municípios Dionísio Cerqueira, Extremo Oeste de Santa Catarina, e Bernardo de Irigoyen, este na Argentina, separado também de Barracão, por um parque e uma “avenida internacional”. Assim como está na fronteira com a Argentina, é limítrofe de Santa Catarina com o Paraná - cidade de Flor da Serra do Sul.
Diabético do tipo 1 há 20 anos, o médico interno, psicólogo mestrando em Diabetes/Obesidade, Javier Cordeiro tem 38 anos e sente na pele diariamente o combate à doença, uma das mais perigosas, porém, controlável e manobrável. Javier planejou a ideia de desenvolver um projeto social denominado Médico DM1 e uma expedição de conscientização da população mundial em relação aos cuidados com a diabetes e demonstrar ser realidade, sim, uma viagem longa de três anos com a doença sob vigilância.
Será uma viagem de três anos e visita a cinco continentes e a mais de 80 países. Lages foi a terceira do roteiro. O médico chegou nesta segunda-feira (3 de abril) e permanecerá na cidade até esta quarta-feira (5 de abril), cumprindo agendas junto a universitários, profissionais e público em geral.
Na segunda, concedeu entrevista a duas emissoras de rádio. Nesta terça-feira (4 de abril), às 19h, participará de uma roda de conversa na Universidade do Planalto Catarinense (Uniplac), a acadêmicos do curso de graduação de Enfermagem e a associados da Associação Doce Vida (instituição de convite a Javier Cordeiro a inserir Lages em sua rota de expedição) e, na quarta-feira (5 de abril), no Calçadão da Praça João Costa, das 9h às 16h, exposição da colmeia e, às 14h30, uma roda de conversa e bate-papo sobre diabetes, com perguntas e respostas para esclarecimentos e troca de diálogos com comunidade e profissionais, como Agentes Comunitários de Saúde (ACSs).
A expedição iniciou no sábado passado (1º de abril), com saída de Dionísio Cerqueira, Em seguida, passou por Chapecó, onde Javier Cordeiro realizou um contato com mães de diabéticos, as chamadas “mães pâncreas”, ou “pais pâncreas”, no caso paterno, nome sugerido por ser a pessoa encarregada de fazer, de modo manual, a mesma função desempenhada por uma pessoa sem diabetes, todavia, de forma automática, relacionando-se ao seu pâncreas. Ou seja, ministrar o uso de insulina e controle da glicemia no dedo. Logo após, o encontro entre expedição e população aconteceu em Joaçaba com o Movimento Pró Vida Diabetes.
No mapa de Santa Catarina, a próxima cidade será Itajaí, Litoral. Depois, o Rio de Janeiro, onde estará pelo período de um mês debruçado sobre a conclusão de seu internato, a conclusão de estudo. A saída do Brasil ficará como o destino seguinte: Argentina.
O prefeito em exercício de Lages, Juliano Polese, e os secretários da Saúde, Claiton Camargo de Souza, e do Desenvolvimento Econômico e Turismo, Álvaro Mondadori (Joinha), recepcionaram Javier Cordeiro na manhã desta terça-feira (4 de abril) em frente à prefeitura. “O Poder Público tem ciência da gravidade da doença de diabetes se não acompanhada com os métodos adequados e sob obediência das restrições. A prefeitura de Lages, por intermédio da Secretaria da Saúde, dispõe de serviços, profissionais e produtos/insumos de atendimento a esta parcela da população para atribuir-lhes melhor qualidade de vida e longevidade”, salienta o prefeito em exercício, Juliano Polese.
Brasileiro argentino ou argentino brasileiro? E o que o move nesta empreitada?
Um super-herói com dois corações patriotas. Quem é Javier Cordeiro? A família de microempreendedores executa atividades de comércio e possui propriedades em ambos os países, justificando a naturalidade brasileira com sotaque argentino. “A gente costuma brincar que minha cidade é ‘Borderline’”, brinca o aventureiro da saúde.
Afinal, quem é ele e quais seus anseios? “Sou metade brasileiro e metade argentino. Como minha família mora na fronteira seca, é só atravessar a rua. Eu e meus irmãos fomos criados nos dois lados. Minha família é desta região e a gente assentou base, raízes de alguma forma, já faz alguns anos. E agora vou morar dentro do carro, pelo mundo. Estamos saindo com o propósito de ajudar pessoas ao redor do mundo levando informação, conhecimento e experiência, já que eu sou diabético tipo 1 há mais de 20 anos. O objetivo é levar um pouco de conscientização sobre esta doença tão impiedosa, pois acomete mais de 200 milhões de pessoas, mundialmente. Falamos incansavelmente em pandemia da Covid-19 (novo coronavírus), mas hoje uma das doenças que mais matam, pela consequência, é a diabetes, atualmente associada à obesidade. Mais da metade da população mundial tem sobrepeso, cerca de 60%, sendo 30% obesa”, exemplifica o especialista.
Fama? Promoção pessoal? Não, não! A intenção está longe disto. “Eu nunca pensei em ficar famoso. Meu projeto é algo que estou fazendo de coração, porque sinto seu grato por hoje estar vivo na verdade, pois se eu fosse diabético há 70, 100 anos, praticamente eu duraria pouquíssimos dias, até porque não existia insulina. Elaborei o projeto desinteressadamente, de maneira sutil, contudo, a proposta tomou uma dimensão maior, de um jeito inesperado e estou tratando de produzir o máximo de conteúdo para que o ‘pessoal’ se sinta pelo menos se sinta acolhido. Se trazer um pouco de acolhimento, o projeto já valeu a pena”, confessa Javier Cordeiro, lembrando que nunca sofreu complicações: “Sempre cuidei da doença, sempre a levei com seriedade, responsabilidade.”
Ele encara esta sem ninguém como companhia?
Sozinho e solteiro, Javier Cordeiro segue corajoso na sua missão. Pai de uma menina de dois anos, ele já garante que a cada quatro meses terá um encontro com sua filha, pois há saudades que apenas as redes sociais ainda não superam. “Vou ver ela, esteja eu onde estiver.” E se alguém acredita que alguém pôs freio neste sonho da expedição, está enganado. “Minha família apoia e se trata disto, dar o que ‘tu’ receber.”
Doença silenciosa e sem precedentes em sua família
Ao todo, os pais de Javier Cordeiro tiveram cinco filhos, destes, três homens e duas mulheres. Não há nenhum histórico genético ou não, de diabetes na família do médico.
Um homem de fé
Percebe-se um rosário azul no bolso direito da calça jeans de Javier Cordeiro. O “terço” recebeu a bênção do bispo diocesano de Lages, Dom Guilerme Werlang na manhã desta terça-feira (4 de abril), em frente à Catedral Diocesana. “Foi um prazer enorme. Sempre no meu discurso vocês vão escutar eu falar principalmente em Deus. Acho que o primeiro motivo foi Ele. Deus me deu oportunidade de estudar, entender a minha doença e em chegado momento falei que isto era muito bom, mas o conhecimento somente é realmente bom se for compartilhado. Vou ficar em torno de três anos correndo mundo afora e passar por cinco continentes e mais de 80 países, levando justamente isto, o conhecimento que eu adquiri, tanto por estudos, quanto pela vivência - sou especialista em diabetes, médico clínico geral, psicólogo (minha primeira formação) e hoje estou concluindo uma especialização em diabetes na Argentina, e outra em obesidade, na Espanha. Portanto, este conhecimento que eu absorvi , tanto de forma acadêmica, quanto de experiência sendo diabético, vou passar adiante, e aprender também”, reconhece.
Mas, e quanto custa esta “brincadeira” que não é brincadeira?
Javier Cordeiro investiu recursos próprios na expedição, no valor superior a R$ 1,5 milhão, entre aquisição de veículo, adaptação externa e interna da Camper, plotagens, mobiliário (cozinha com eletrodomésticos, como, uma geladeira; banheiro, e cama), compra de um drone, materiais de divulgação (como, camisetas). Somente a caminhoneta beira R$ 600 mil. Ah, e é claro, um estoque de insulina. “Que é o que eu preciso para viver”, enfatiza.
Bater na mesma tecla salva vidas
Um recado nunca é demais. “A melhor mensagem a ser passada é: Você que tem diabetes, busque ajuda. Hoje é impensável tratar diabetes de forma unidisciplinar. A diabetes é tratada ‘multidisplinarmente’, com psicólogo, nutricionista, médico. Diabetes não cuidada ‘vai vir’, vai cobrar e passar a fatura. Então, paciente e sociedade, estejam atentos”, clama Javier Cordeiro.
Para seguir Javier Cordeiro e inteirar-se da expedição e do tema da diabetes em publicações diárias, basta acessar a plataforma digital Instagram: @javiercordeiro e/ou @medicodm1. As hashtags são #javierdm1, #medicodm1 e #sigaacolmeia.
Em breve, um canal será aberto no YouTube, e deverá ser “Javier Cordeiro” ou “Médico DM1”. O site www.medicodm1.com ainda está em construção.
Entenda mais sobre a diabetes
Atualmente, a diabetes acomete mais de 240 milhões de pessoas no mundo inteiro, uma das epidemias que mais atingem as pessoas devido ao estilo de vida, ao alimento consumido. No Brasil há aproximadamente 19 milhões de pessoas com diabetes, sendo 90% tipo 2 e 10% tipo 1. Os mais conhecidos são os tipos 1 e 2. O 3 está associado mais à doença de Alzheimer e existe, ainda, uma outra condição de diabetes, a gestacional.
Lages tem o Hiperdia
O Programa Nacional de Hipertensão e Diabetes (Hiperdia) está atrelado diretamente à Secretaria Municipal da Saúde de Lages. Um programa ministerial (Ministério da Saúde - MS) que gera recurso para assistência farmacêutica, cadastramento e acompanhamento de portadores de hipertensão arterial e/ou diabetes mellitus, atendidos na rede ambulatorial do Sistema Único de Saúde (SUS), permitindo gerar informação para aquisição, dispensação e distribuição de medicamentos de forma regular e sistemática a todos os pacientes cadastrados.
O secretário da Saúde de Lages, Claiton Camargo de Souza, explica que, em Lages, o Programa é bem completo dentro da Atenção Primária. “Todas as nossas Unidades - Unidades Básicas de Saúde - UBSs - estão devidamente preparadas e oferecem suporte para todo paciente. Assim como fornecemos toda a assistência dentro do município, com distribuição de fitas reagentes para glicosímetro à aferição. Nós também contamos com as entidades, como a Doce Vida, que complementam a proximidade junto ao público diabético para a gente poder pleitear as demais ações e também ter apoio dentro das estratégias que a gente adota dentro do município.” Contato Hiperdia: 3251-7986.
Você conhece a Associação Doce Vida, atuante há 14 anos em Lages?
A Associação de Diabéticos Doce Vida existe em Lages desde 2009, com os enfoques de acolhimento, prestação de orientações e disseminação da educação em diabetes à pessoa com diabetes e seus familiares e amigos. No grupo de WhatsApp da instituição são 125 pessoas, 105 cadastradas online e mais de mil seguidores no Instagram.
A entidade possuía cedência de espaço no Colégio Santa Rosa e no ano passado realizou um projeto de extensão e foi para a Universidade do Planalto Catarinense (Uniplac). Então, uma vez por mês (última terça-feira de cada mês), às 19h, promoção de uma palestra gratuita sobre diabetes e comorbidades, geralmente explanada por especialista, de acordo com a presidente da Associação Doce Vida, Michely Arruda Bernardelli.
Texto: Daniele Mendes de Melo
Fotos: Toninho Vieira